Deus acreditou em nós, em nossa capacidade de amar. Chorou a nossa lágrima e devolveu-nos o sorriso da esperança¹
Ir. Paulo Dullius
- A alegria pela presença do Deus da vida
O Natal é a festa da alegria, da esperança e da vida. Nós nos alegramos porque Deus se encarnou, se fez humano para recuperar a liberdade para todos os seres humanos. Com o nascimento de Jesus se reacendeu a grande luz da esperança e da vida. Agora temos acesso a Deus, à sua imagem, à sua presença. A dinâmica do Natal se concentra na caminhada em favor da vida pautada no amor e na misericórdia.
O Natal é a celebração da humanização de Deus que fez o itinerário de vida como um de nós e nos mostrou sempre a imagem de Deus no rosto humano. O caminho da salvação veio pela humanização de Deus. As imagens, simbologias e mensagens presentes na celebração do Natal se concentram na alegria pela encarnação de Deus e na realidade nova da superação do mal e da escravidão, para viver a fidelidade salvífica que reacende a luz da esperança.
- Os principais momentos de nossa história
A história cristã se estrutura e organiza ao redor de três momentos nos quais Deus manifesta sua imagem.
1) Na criação Deus nos oferece sua imagem e a coloca na criatura humana, ou seja, como Deus humanizado para comunicar sua vida. Figura e objetivamente se fala que Deus se encontrava com o ser humano e que viviam felizes e livres porque participavam da vida do próprio Deus. A partir desta imagem permanece no coração humano a grande tendência ao amor, à felicidade, à liberdade. Todos sabemos que a história humana se desenvolveu ambiguamente em relação a esta imagem de Deus. Introduziu-se o mal e as diversas estruturas do mal. Também seguem tantos testemunhos da superação do mal, seja em pessoas, em instituições e em estruturas organizativas.
2) A segunda imagem, e praticamente a imagem definitiva, podemos encontrar quando Deus se manifesta na salvação do homem. Deus coloca sua imagem no rosto de seu Filho que nasce entre nós, na condição humana. A imagem de Deus se encarna para salvar a vida. A forma pedagógica de Deus é a humanização de sua imagem. O caminho da salvação veio pela humanização de Deus. E nós, quanto mais humanos formos, mais seremos instrumentos desta salvação.
A humanização de Deus através do nascimento de seu filho Jesus continua sendo a imagem mais significativa de Deus, pois é expressão de amor, misericórdia, alegria… porque a luz da vida é acessível a todos. “Quem me vê, vê o Pai”. A inesgotável imagem salvífica do Deus humanizado foi e continua sendo a causa de nossa esperança, de nosso amor ao próximo e da gratidão infinita a Deus. Numa palavra, Deus se encarna para salvar a vida do ser humano de tudo o que a prejudica.
3) Se as duas imagens precedentes se referem a toda a humanidade, uma terceira imagem de Deus se revela a cada ser humano quando termina uma das etapas de seu itinerário para o encontro com Deus. É o momento da morte física na qual nossa identidade se definirá principalmente pela nossa dimensão espiritual. No fim desta etapa da vida, a imagem de Deus se manifesta face a face, e o veremos glorioso e nos colhendo-nos com amor para a eternidade feliz. O encontro da humanidade com o Deus glorioso será no fim dos tempos. Deus nos amou desde sempre. Podemos viver livres, reconciliados, em paz, com esperança e fé.
- O Natal como a humanização de Deus
Natal é a festa da dinamização da vida. É a expressão viva da paz e do amor. A salvação está a nosso alcance porque Deus deixou a glória, desceu para nos erguer até Ele. Veio ser um de nós para nos tornar um dos seus filhos. Jesus se encarna e está entre nós. Esta presença visível começa com sua encarnação, nascimento, vida, morte, e continua através de seu Espírito. Jesus trouxe a nós a imagem do Deus que salva, que ama e que nos restitui a vida plena.
A humanidade se alegra e se expressa em simbologias de luz, de alegria, de fraternidade. A rememoração da encarnação pelo nascimento de Jesus como criança é celebrada através de diversas simbolizações que acentuam a semelhança a tantas experiências humanas, sobretudo às dos mais frágeis. A experiência cristã de Jesus criou histórias em relação a este nascimento que significam a importância de Jesus para a humanidade. Jesus não se encarna para divinizar o ser humano, mas para nós, seres humanos, experimentarmos o Deus humanizado. Esta humanização convida a um profundo discernimento sobre a dignidade, o valor e o significado do ser humano. Permite também discernir ações que promovem a dignidade humana para além de cultura, idade, gênero, raça, condição social.
O Jesus que nasce se constitui num permanente discernimento sobre o que é humano e o que é inumano. Sua vida consistiu numa presença permanente para tornar humano o inumano através de curas físicas, psíquicas e espirituais, através de reinserção social dos marginalizados, através de tudo que significa realizar o Reino de Deus aqui e agora.
- A humanidade que acolhe Jesus na alegre esperança
A simbologia da representação do nascimento de Jesus se origina a partir dos primeiros séculos do cristianismo. Colocado numa paisagem cósmica religiosa, o nascimento de Jesus ressalta, em seu significado central, o reconhecimento de Jesus como o salvador, como o restaurador da vida. Todos os povos reconhecem em Jesus o Messias salvador, aquele que vai libertar Israel e a humanidade do mal e de toda espécie de forma inumana.
As figuras presentes no presépio se entendem a partir deste reconhecimento salvífico, da vida nova e plena. O boi representa o povo judeu, até o presente momento sob o jugo da lei. Sua presença significa o desejo de superar a escravidão da lei e assumir a liberdade dos filhos de Deus. Aqueles que já acolheram o salvador, o Deus humanizado, são representados pelos pastores que se alegram com a nova esperança e vão louvar a presença da salvação. O burro significa os povos pagãos dominados pela idolatria e ignorância.
A superação da lei e da ignorância e da idolatria se expressa na presença destes dois animais na simbologia do presépio. Podemos constatar a presença já experimentada da salvação e da vida na figura dos magos – três raças, representando a humanidade que se alegra com a esperança e a vida nova. A humanidade, então representada pelos judeus e não judeus (boi e burro), já não se alimenta do feno da ignorância, da idolatria e da escravidão da lei, do mal e do inumano, mas se alimenta da vida, de Jesus representado como reclinado na manjedoura.
Nas representações do Natal dos primeiros séculos, José e Maria não faziam parte porque a mensagem central gira em torno do reconhecimento da nova imagem de Deus que se fez humano como nós. Ao redor do ano 700 de nossa era José e Maria passam a integrar a representação do natal do Senhor da vida, e os pastores deixam esta proximidade. Esta representação enche a todos de alegria, de paz, de acolhida, de bondade.
- Caminhar na direção da vida
Deus se revela como Deus da vida, e vida plena. O nascimento de Jesus nos convida a caminhar para a vida e o amor, para motivações salvíficas. Se olharmos por este prisma a movimentação, o caminhar itinerante dos personagens envolvidos no Natal, podemos nós nos unirmos a eles e empreender o caminho na direção da vida hoje, sobretudo junto àqueles que mais precisam. Toda dinâmica da rememoração do Natal está colocada a serviço da vida.
“Deus tomou a iniciativa de pôr-se a caminho em nossa direção para nos oferecer a vida plena da salvação. O anjo Gabriel desce até Maria para anunciar a vida. Maria caminha até Isabel para servir a vida. José e Maria se puseram a caminho de Belém para nascer a vida. Anjos se puseram a caminho dos pastores para anunciar a vida. Os pastores se puseram a caminho da gruta para adorar a vida. A estrela se pôs no caminho dos magos para indicar-lhes o rumo da vida. Os magos se puseram a caminho de Belém para encontrar, adorar e presentear a vida”[1].
O Natal precisa provocar a dinamização de nosso interior para descobrir, proteger e promover a vida onde ela acontece. Desde a concepção até o último momento da vida, a presença de todo ser humano precisa ser preparada, desejada, esperada, dignificada e promovida. Revivemos e resgatamos o natal de Jesus porque foi o momento em que Deus se fez criança para caber na manjedoura de nosso coração e ser cada dia colocado na nossa história e na história de nossas estruturas. O Natal nos faz caminhar ao encontro da vida, a vida de Deus na vida dos irmãos. Como Deus, também seguimos o caminho do amor e da vida onde estes estão presentes ou ausentes. Vivemos a alegria da esperança porque o Deus de Jesus é um Deus humano a serviço da vida.
[1] José Acácio Santana – Natividade Oratório do Natal.
[2] José Acácio Santana, in Natividade…

Veja Também:
https://www.ihu.unisinos.br/615551-familia-de-nazare-o-ambiente-de-humanizacao-de-jesus / https://domusasf.com.br/votos-de-esperanca-para-o-novo-ano-de-2020/